Tribunal brasileiro concorda em tomar uma decisão relacionada ao cultivo de cânhamo, mas legislação fica para trás.

Um tribunal brasileiro concordou em tomar uma decisão sobre um caso que daria luz verde a empresas e agricultores para cultivar cannabis, mas mesmo com um resultado positivo no caso, o Brasil ainda pode demorar anos até estabelecer uma estrutura legal para a indústria do cânhamo.

O Tribunal Superior de Justiça (STJ), principal instância de recurso do Brasil, julgará o caso, no qual a DNA Soluções em Biotecnologia pretende importar sementes de cultivo e plantas industriais de cânhamo. Espera-se que o tribunal tome uma decisão definitiva nos próximos 12 meses.

Embora o caso possa estabelecer um precedente legal no Brasil, o país ainda precisa de leis e regras específicas para orientar as indústrias de cannabis, disse Lorenzo Rolim da Silva, presidente da Associação Latino-Americana de Cânhamo Industrial (LAIHA).

Levantar questões

“Embora aparentemente muito promissora, essa possível decisão do STJ deixa mais perguntas do que respostas”, disse Rolim da Silva. “Não está claro como tudo vai acontecer caso eles decidam positivamente.”

Embora uma decisão positiva para a cannabis no tribunal provavelmente chame a atenção dos legisladores, ela não os obrigará a fazer o que a indústria do cânhamo realmente precisa: criar leis e regras claras. Na ausência de um sistema regulatório, o Ministério da Agricultura e a ANVISA, a autoridade sanitária brasileira, não têm como orientar o setor, segundo da Silva.

“A decisão não pode obrigá-los realmente a criar a lei e os regulamentos sobre o cultivo de cannabis. Isso é algo que só o poder legislativo pode fazer no Brasil”, afirmou.

Outros casos semelhantes sobre licenças de cânhamo estão pendentes nos tribunais brasileiros. Da Silva disse que uma decisão a favor da cannabis poderia desencadear ainda mais desafios.

“Uma decisão positiva daria um sinal claro a qualquer empresa ou pessoa no país para simplesmente iniciar um processo legal contra o estado e começar a cultivar a sua cannabis sem quaisquer regras ou regulamentos”, disse ele, observando que “resta ver se isso seria positivo ou negativo para a indústria como um todo.”

Processo lento

Os legisladores brasileiros pararam repetidamente o progresso numa estrutura abrangente de cannabis. O processo legislativo da cannabis no país começou em 2015 com um projeto de lei original que foi posteriormente substituído por uma  proposta atualizada em 2020 . Desde então, pouco aconteceu.

“O Congresso tem um pouco de medo de decidir sobre a questão da cannabis, pois é controversa”, disse o advogado Arthur Arsuffi à Reuters . “Então isso tem adiado uma decisão e, com a quantidade de processos, o judicial acaba por ter que resolver a questão”, disse Arsuffi, que representa a DNA Soluções em Biotecnologia no caso.

Apesar da proibição do cultivo doméstico de cânhamo, os produtores brasileiros podem importar matérias-primas para fazer CBD, que é legal por prescrição sob a lei de cannabis medicinal do país. A cannabis medicinal também está disponível para pacientes sob essa lei.

As regras atuais da ANVISA já permitem a importação e comercialização de medicamentos derivados da cannabis registados como farmacêuticos e aqueles com “autorização sanitária” que não requerem ensaios clínicos, conforme regulamentação que entrou em vigor em março de 2020. Que A regra também prevê a autorização de “uso compassivo” que permite que os pacientes importem produtos de cannabis individualmente.

Mercado do CBD preparado

A ANVISA estima que mais de 100.000 brasileiros fazem algum tipo de tratamento com CBD – muitos obtendo produtos no mercado negro – e que anualmente são registadas 66.000 prescrições de medicamentos à base de cannabis, incluindo o CBD. O Brasil tem vários milhões de epilépticos e pacientes com outras doenças, como autismo e dor crónica, que poderiam ser beneficiados com o CBD. Sob forma de subsídios de remédios no Brasil, o governo oferece apoio generoso aos pacientes.

Observadores dizem que o potencial da cannabis medicinal pode aumentar assim que as leis forem estabelecidas, com estimativas de que o setor pode atingir um faturamento de US$ 5 bilhões nos próximos três anos. Vários importadores já estabeleceram cabeças de praia no Brasil, incluindo a GW Pharmaceuticals do Reino Unido, que vende o seu medicamento Sativex à base de CBD em farmácias. A empresa farmacêutica brasileira Prati-Donaduzzi também está autorizada a fabricar e distribuir certos produtos de cannabis através de lojas da área.

Maior país da América do Sul, o Brasil é o quarto maior mercado farmacêutico do mundo. A GW Pharmaceuticals do Reino Unido já vende seu medicamento para epilepsia Sativex à base de CBD em farmácias brasileiras, e grandes empresas farmacêuticas demonstraram interesse no potencial do Brasil em CBD.

Além do CBD

Além do CBD, a última proposta legislativa, apresentada em 2020, abriria caminho para produtos de saúde e beleza, celulose, fibras, veterinária não medicinal e sementes alimentares.

O Brasil é o quarto maior país agrícola do mundo atrás da China, Índia e Estados Unidos, com potencial para cultivar cânhamo em grande escala, abrindo oportunidades para a produção de sementes e fibras.

Com um mercado de 214 milhões de consumidores, custos gerais de produção mais baixos, um forte histórico de produção de alimentos e um clima favorável ao cânhamo, o Brasil pode se tornar um grande concorrente internacional nos setores à base de cânhamo.

O Brasil também é líder na indústria global de celulose e papel, principalmente um mercado de exportação, mas no qual se espera que os insumos de cânhamo se expandam à medida que cresce a demanda por matérias-primas sustentáveis.