Os produtores de cânhamo em Portugal afirmam que a época de cultivo de 2019 está perdida

Alguns agricultores portugueses dedicados ao cânhamo afirmam que irão desistir da época de cultivo de 2019 dada a permanente confusão jurisdicional entre duas agências governamentais sobre a questão do licenciamento.

O problema começou quando o Ministério da Agricultura português emitiu um esclarecimento em janeiro de 2019, indicando todas as autorizações relacionadas com o cânhamo sujeitas a revisão pelo INFARMED, a entidade reguladora portuguesa para a saúde, que tem autoridade sobre os produtos farmacêuticos e substâncias controladas.

O esclarecimento surgiu após a promulgação de uma nova lei sobre canábis medicinal aprovada em agosto de 2018, que definiu regras para toda a cadeia de valor do setor; os regulamentos sobre a canábis medicinal abordam o cultivo, a produção, a extração e o fabrico comercial, além do comércio grossista, a distribuição para farmácias, a importação e a exportação, o trânsito e as vendas.

Os reguladores estão relutantes

A nova lei, juntamente com a sua a clarificação, exige que os agricultores de cânhamo se submetam a um regime de licenciamento tão rigoroso como aquele que contempla as licenças médicas da canábis em Portugal. Mas o INFARMED parece isentar-se de responsabilidades perante o cânhamo.

“Recentemente, levámos um grupo de agricultores às reuniões com a DGAV (Direção Geral Alimentar e Veterinária do Governo) e com o INFARMED, para descobrir qual destas entidades certifica as sementes e dá permissão para plantar cânhamo”, afirmou Hugo Monteiro, produtor de cânhamo e membro fundador da LUSICANNA – uma cooperativa de agricultores e processadores portugueses de cânhamo. Monteiro disse também que o INFARMED informou o seu grupo que não era responsável pelo cânhamo.

A nova lei da canábis, promulgada em agosto último, criou uma zona cinzenta. Enquanto isso, um regulamento prometido para início deste ano, o qual deveria abordar o licenciamento do cânhamo, continua por emergir. O governo não cumpriu a sua promessa. Fontes disseram à HempToday que o regulamento sobre o cânhamo está em rascunho, aguardando a aprovação do INFARMED.

“Durante 3 meses, eles (DGAV e INFARMED) estiveram a empurrar o assunto com a barriga”, sonegando quaisquer responsabilidades pelo licenciamento do cânhamo, afirmou Monteiro. “Ninguém quer correr o risco de certificar as sementes”.

Segunda missão de base

As visitas dos representantes da LUSICANNA às duas agências aconteceram após mais de 40 interessados portugueses no cânhamo terem assinado em março uma carta aberta ao governo. Nela solicitam o restabelecimento do licenciamento do cânhamo, após este ter sido suspenso no início de 2019 devido à questão da jurisdição.

Nos últimos dois anos, os agricultores portugueses de cânhamo conseguiram obter licenças, tendo para isso de apresentar à DGAV a identificação das suas parcelas de terreno e as datas estimadas para o semeio e colheita. Este ano, o caos ameaça pôr termo às relações comerciais que muitas empresas trabalharam arduamente para estabelecer, segundo Monteiro.

“É mau pois as relações comerciais começaram no ano passado. Fizemos bastantes análises e amostras para sustentar a confiança nos nossos produtos”, disse. “Agora não temos produção para os nossos clientes. Isto transmite a ideia de que a indústria é pouco fiável. É extremamente negativo para a nossa imagem e os nossos clientes acabarão por comprar a outros países”.

Plantar ilegalmente é ‘uma opção’

Monteiro afirmou que alguns agricultores de cânhamo estão a avançar com as culturas para esta primavera. “Estão a contornar a lei. É uma opção, mas será difícil venderem as colheitas”, disse Monteiro.

Ele adianta que o seu grupo pode não ter outra escolha senão levar o governo a tribunal. “Temos 250 quilos de sementes à espera”, disse. “Estamos já a fazer cálculos às perdas”.

Pelo menos duas grandes empresas canadianas de canábis estão já a operar em Portugal. Em janeiro deste ano, a ICC International Cannabis Corp. do Canadá concordou em comprar 100% da portuguesa Enigma Unipessoal Lda. E a empresa médica Tilray, sediada no Ontário, anunciou em 2017 uma operação de cultivo e processamento no valor de 20 milhões de euros, após ter recebido aprovação para importar e cultivar sementes e clones de canábis.